Thabata é engenheira biomédica especialista em próteses de impressão 3D para crianças. Agora ela quer ajudar pacientes de Covid-19 que precisarem de equipamentos hospitalares como respiradores artificiais.
Pensando na falta de respiradores artificiais para atender a população que pode vir a adoecer por causa do Covid-19, a infecção causada pelo coronavírus, a engenheira biomédica Thabata Ganga, de 26 anos, criou uma rede de designers, engenheiros e pesquisadores para produzir peças para máquinas hospitalares.
Especialista em impressão 3D de próteses para a área da saúde, Thabata fez uma postagem nas redes sociais na quarta-feira (18) procurando especialistas para ajudá-la no projeto. Ela criou um cadastro online de profissionais e, em menos de 24 horas depois, quase 500 profissionais de todo o Brasil já havia se cadastrado na rede.
“A ideia é nos unirmos para identificarmos os equipamentos quebrados nos hospitais públicos que seriam usados para atender pacientes graves de coronavírus. A partir daí, projetaremos as peças no computador e faremos a impressão 3D delas”, explica Thabata.
Contudo, a ideia não é tão simples. “Se trata da produção de um equipamento médico. Não podemos fazer em qualquer ambiente e de qualquer jeito. Mas, se conseguirmos, vamos economizar tempo e dinheiro”, diz a engenheira, explicando que muitas dessas peças são importadas. Por causa do fechamento de fronteiras na Ásia e Europa em razão do novo coronavírus, o Brasil não teria como comprar essas peças.
Formada pela Universidade Federal de São Paulo, Unifesp, em 2016, a profissional procurou seus antigos professores para ter apoio e autorização para usar o laboratório de impressão 3D da universidade.
“Além de ter o apoio de um antigo professor especialista na área, a própria reitoria da Unifesp me avisou que já procurou o Ministério da Educação para pedir verba para comprar o material que será usado na fabricação das peças”, comemora. “Queremos fazer esse projeto com ajuda do governo, e não de doações, mesmo porque não temos tempo para lidar com contabilidade nesse momento.”
A docente e pesquisadora da engenharia biomédica Maria Elizete Kunkel, do Grupo de Biomecânica e Tecnologia Assistiva da Unifesp, também dará apoio à rede formada por Thabata, junto como o laboratório de impressão 3D, o Biofabris. O laboratório é um dos maiores e mais importantes da América Latina e referência em produção de próteses 3D de crânio.
“A impressão 3D é uma técnica que permite a manufatura, de modo real, de qualquer desenho feito do computador, de um objeto, de uma peça. E isso dá uma versatilidade muito grande numa produção local”, explica Kunkel.
Dependendo do tamanho da peça, o objeto poderá ser impresso em até uma hora. “Os equipamentos de uma UTI (unidade de tratamento intensivo) são padronizados. Algumas peças podem ser preparadas e deixadas no modo digital. Quando precisarmos delas, é só imprimir”, garante a professora.
“Quando o paciente grave de coronavírus é internado, ele precisa de um respirador artificial. Teremos um aumento da demanda. Teremos [respiradores] para todos? Ainda estamos numa situação que temos tempo para se preparar para isso”, completa Kunkel.
Além de ajudar a salvar pessoas que precisarão de respiradores artificiais durante a infecção por coronavírus, Thabata acredita que “quando tudo acabar, teremos um inventário dos equipamentos dos hospitais públicos feito pela rede colaborativa, um inventário mostrando o que funciona, o que está quebrado e o que precisa ser reposto.”
Inspiração na Itália
Médicos fazem desabafo sobre situação em hospitais da Itália por causa do coronavírus
A ideia de produzir peças em 3D para máquinas hospitalares proposta por Thabata foi inspirada na experiência de dois italianos, Cristian Fracassi e Alessandro Romaioli, que produziram válvulas para consertar respiradores de um hospital na Itália por meio de impressão 3D no começo de março.
Mais de 4 mil pessoas morreram na Itália por causa do novo coronavírus até esta sexta-feira (20), mais de 600 somente nas últimas 24 horas. O número já ultrapassou o total de vítimas na China, país onde começou a pandemia da Covid-19.
“Esses italianos conseguiram identificar a peça que estava quebrada e descobriram que o fabricante não estava dando conta de produzi-la para atender a demanda de respiradores na Itália. Foi aí que eles desenvolveram uma réplica usando a impressão 3D”, explica Kunkel.
No dia 13 de março, os hospitais do norte italiano, região mais afetada, começaram a divulgar que estavam superlotados e não teriam como atender a todos os pacientes graves por falta de respiradores artificiais.
Fracassi e Romaioli imprimiram as peças em seis horas. A iniciativa salvou a vida de dez pacientes
No entanto, segundo o jornal italiano La Stampa, a dupla está sendo ameaçada pelo fabricante de ser processada por quebra de patente. Ainda de acordo com a publicação, as válvulas são vendidas por cerca de 11 mil dólares, enquanto que as réplicas de impressão 3D custaram um dólar.
“As peças podem ser usadas nesse contexto porque é uma solução para uma emergência, que poderá salvar vidas”, explica Kunkel.