Por Felipe Machado
Como era a cidade de Divinópolis 100 anos atrás, em 1925, de acordo com registros do jornal ‘A Estrella da Oeste’, do mesmo ano.
Em 1925 o Divinópolis possuía apenas 13 anos de emancipação política, ocorrida em 1º de junho de 1912. Era uma cidade ainda pequena, onde o sistema moderno de largas e retas avenidas ainda eram mal traçadas, de terra, poeira e muito mato. A parte velha e a parte nova se dividiam, fisica e psicologicamente, numa briga entre conservadores e progressistas. Na política, o Partido Dominante e Partido Reformador, mais conhecidos popularmente, pelas palavras de Pedro X. Gontijo, como “Partido dos Machos” e o “Partido das Fêmeas” disputavam o poder na Câmara Municipal, presidida pelo Coronel João Notini, que renunciou naquele ano, para que assumisse seu vice, Olímpio Moreira de Vasconcellos.
Novos prédios surgiam. Os recém-chegados Franciscanos erguiam o seu Convento e Capela, na Avenida 21 de abril. O poder público edificava a nova Câmara Municipal, já que o primeiro prédio, erguido em 1916, desabara o assoalho. Inaugurava-se também o prédio da Cadeia Pública, no alto da Praça do Santuário, pronto para vigiar, prender e treinar o serviço militar. O segundo prédio do Grupo Escolar, na Avenida, ficava pronto para atender novos alunos.
A sociedade divinopolitana cada vez adentrava ao Século XX. Veículos já circulavam nas esburacadas ruas há mais de uma década, mesmo que aos poucos, ainda confrontando com carros de bois, carroças, etc. Apareciam algumas bicicletas. O primeiro ônibus coletivo urbano, o popular “grizú”, rodava pela 1º de Junho e Rua Goiás, custando 200 réis a passagem e pilotado pelo chouffer Fagundes.
Pessoas chegavam e saíam da cidade pela movimentada Estação da Estrada de Ferro Oeste de Minas, no grande entroncamento nessa cidade que cruzava em X as ferrovias que ligavam São João del Rey e Barra do Paraopeba com a de Belo Horizonte que ia para o Triângulo. Aqui, aportaram imigrantes, inúmeros italianos, libaneses, como Halim Souki, e interioranos, como Jovelino Rabello, figuras que se tornaram ilustres e que aqui se estabeleceram naquele ano.
Em vista que a cidade crescia, novos perigos ocorriam. Três anos antes, em 1922, o então Presidente da Câmara, Isauro Ferreira, fora assassinado num crime passional que chocou a cidade. O assassino, confesso em agir por legítíma defesa da honra, acabou inocentado, parecer que nunca foi digerido pelas testemunhas da época. Em 1925, um furto de joias no trem da Oeste de Minas, numa encomenda do Sr. Lucas Penna, proprietário da “Ourivesaria Penna”, também chocou a cidade. Ao encomendar e receber um pacote da Aaron, Irmãos & Cia, de São Paulo, chocou-se ao receber o produto vazio aqui nesta cidade, num prejuízo de 500 mil réis!
Como se vê, era movimentada a vida mesmo na ainda pacata Divinópolis de 1925. Além desses fatos, o jornal ‘A Estrella da Oeste’ trouxe em suas reportagens uma interessante matéria nomeada “Na Vertigem Do Progresso”, relatando os avanços da cidade de Divinópolis e suas novas construções. O jornal pertencia aos órgãos do governo municipal, e foram por muitos anos, nas primeiras décadas do Século XX, o principal veículo de comunicação, informação e registro na cidade e na região. A reportagem, datada na edição do periódico de 28 de junho de 1925, retrata como era Divinópolis naquele tempo, há 100 anos:
Em “Na Vertigem Do Progresso — As construções na parte velha da cidade” destaca-se:
- “Na Avenida 1º de Junho, da parte que se estende para o Largo da Matriz, estão sendo alinhados diversos prédios. Logo adiante da Coliectoria Federal, na Travessa Santo Antônio, a exma. sra. Gabriella Alves Garcia, à esquerda de quem sobe a aludida travessa, está construindo uma boa casa;
- À direita da mesma travessa, o Sr. Francisco Ferreira da Silva já está alevantando os alicerces de um grande edifício que se destina a localizar o seu estabelecimento comercial;
- Mais adiante, ainda na Av. 1º de Junho, o Sr. Oswaldo Machado está construindo uma confortável vivenda;
- Junto à casa do Sr. João Morato, está sendo erguido um espaçoso barracão onde funcionará a fábrica de ladrilhos hydraulicos, de propriedade dos intelligentes industriaes Manoel Pires e Antônio Loureiro;
- Na esquina da Rua Itapecerica, mesmo defronte do estabelecimento do Sr. José Jacintho, o Sr. Alfredo Rachid pretende adiquirir terreno para edificar um prédio para o commercio de generos e fazenda;
- Na mesma rua, em frente a casa comercial de d. Bebbiana Michelini, o Sr. Sebastião Pardini, activo commerciante em nossa praça, está construindo também sua casa própria;
- Na Av. 1º de Junho, acima da casa do Sr. José Jacintho e quasi na entrada do Largo da Matriz, já está magnificamente funccionando o novo açougue de carne bovina, de propriedade dos srs. Antônio Nogueira Penido e Jesus Machado, e installado mediante um contracto com a Câmara Municipal;
- De frente ao açougue, o Sr. Jesus Machado, homem trabalhador e progressista, está já activando sua casa de residência;
- À entrada do Largo, no sobradinho de propriedade do Sr. Cel. João Epiphânio, acaba de ser montado, no 1º sub-compartimento, um magnífico salão de barbeiro e cabelleireiro de propriedade do distincto moço José Silva. Na segunda dependência da parte baixa do sobradinho, foi montada ha puco uma bem sortida casa de bebidas e mantimentos da criteriosa firma Ubiraja Ferreira & Comp.;
- No Largo da Matriz, adiante da casa do Sr. Cel. João Severino de Azevedo, o Sr. Necezio Barreto do Nascimento, obedecendo ao excellente traçado de nossas ruas, tem quasi pronta uma vasta casa para moradia;
- A Camara Municipal, ha pouco, mandou collocar, perto da casa da parochia, uma torneira d’água para serventia pública;“
Naquele ano, novas leis sobre construções de novos prédios na cidade haviam sido anunciadas pelo poder legislativo, passando a permitir edifícios sem platibandas e com afastamentos em relação ao alinhamento da rua, obrigando os proprietários também a preencherem esses espaços com jardins e cercá-los com gradis.
Outra lei também proibia que os construtores de usarem tijolos mal queimados e argamassa de barro, e também que o mesmo indivíduo construísse dois edifícios em diferentes lotes simultaneamente. As leis foram publicadas pelo então presidente da Câmara, Cel. João Notini, na data de 25 de janeiro de 1925.
1925 marcou também a chegada do abastecimento de água na cidade, anunciada pelo jornal ‘A Estrella da Oeste’. O serviço teve como local de implantação o então ponto mais alto da parte urbana da cidade, no alto da Rua São Paulo, entre as avenidas Sete de Setembro e Rio Grande do Sul. A coleta da água se dava no córrego que nascia nas proximidades da Fitedi, no Catalão.
“ABASTECIMENTO DE ÁGUA”
Conforme a lei n. 107, foi posto em hasta pública o abastecimento de água à cidade, tendo sido aceita a proposta do Sr. Nilo Rosemburg, única apresentada, e o contrato foi assinado pelos procuradores Snrs. J. Rabelo & Cia, aos quais ficou entregue o serviço.
Foi escolhido o local mais alto da cidade para a construção do reservatório, com capacidade para 300.000 litros d’água.
Devido à falta de manancial que desse altura suficiente para o abastecimento da parte mais elevada da cidade, a Câmara resolveu fazer o serviço por meio de bombas centrifugas, tendo sido já montada uma dessa, que está funcionando a cotento.
Foi também consertada a estrada de rodagem dos Costas para a Estação de São Gonçalo tendo sido despendida com este concerto a importância de 300$000.”
O esporte bretão era destaque na cidade, e o football animava as tardes de domingo da população. Na época, só existia uma equipe em Divinópolis, o União Football Club, que como o nome já remete, era uma união de todas as equipes dos primórdios do desporto na cidade que para elevar o nome do município, se integraram numa só. Naquele ano de 1925, o União enfrentou equipes de Oliveira, Carmo da Mata e de Carmo do Cajuru, como noticia o jornal “A Estrella da Oeste”, de 12 de junho de 1925:
‘’A partida de foot-ball foi interessante e cheia de lances suggestivos.
O ‘team’ do União esteve num de seus melhores dias: desenvolveu um jogo intelligente, seguro e certeiro. Os seus dianteiros estiveram excellentes, com excepção de Quito, que foi infeliz nas suas escapadas. A linha de ‘’half’’ esteve péssima e ‘’jogou pedra em santo’’. O trio defensivo, sob a guarda de Vicente, Polycarpo e Mariano, esteve supimpa e garantiu a victoria.
O ‘team’ do Cajuru, apezar de forte e trenado, esteve infelicissimo jogando com uma urucubaca ‘’baita’’. A sua defesa esteve regular e resistiu o assédio dos ‘’fowards’’ divinopolitanos. Os seus avantes fraquejaram em meio a partida e perderam boas occasiões para o augmento da contagem de pontos.
A cidadella do Cajuru foi vasada 4 vezes; e a do União, uma vez, proveniente de uma ‘’scrimage’’ á porta do ‘’goal’’.
O árbitro do jogo foi correcto e prudente.