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25 anos sem o maior de todos

O comerciante Eduardo Soncini, de 43 anos, tem um ritual diferente quando vai colocar para dormir o filho Eduardo Teodoro, de oito anos. Antes de cair no sono o menino não quer ouvir histórias infantis ou conversar sobre como foi o dia na escola. Ele gosta de escutar o pai contar curiosidades e detalhes de corridas marcantes de Ayrton Senna, piloto brasileiro que morreu há exatos 25 anos e continua a movimentar uma legião de adoradores. Senna foi tricampeão mundial da F-1.

Os “Sennamaníacos” continuam ativos e sem esquecer a relação com o ídolo mesmo tanto tempo depois do acidente fatal durante o GP de San Marino de Fórmula 1, em 1.º de maio de 1994, mesmo ano em que a seleção brasileira de futebol foi tetracampeão do mundo nos EUA. Quem já acompanhava o tricampeão mundial naquela época guarda relíquias, mantém coleções e não apaga da memória os melhores momentos de Senna nas pistas. Não foram poucos. Além disso, esses fãs cuidam agora de passar para as novas gerações a admiração pelo piloto, que tinha no seu trabalho extremo amor e dedicação.

“Pela alegria que o Ayrton nos deu, a maior retribuição que a gente poderia dar é passar esse legado para as outras gerações. A história dele não pode morrer”, afirmou Soncini. O filho de oito anos aprendeu a gostar de Fórmula 1 apesar de nunca ter visto sequer uma vitória brasileira na categoria. A última foi com Rubens Barrichello em setembro de 2009, antes de Eduardo ter nascido.

Um dos maiores acervos dedicados a Ayrton Senna no Brasil pertence ao empresário Marcus Vinícius dos Santos. São mais de 15 mil itens, como recortes de jornais e revistas, capacetes, jaquetas, bonés e autógrafos. Um dos itens mais caros é a cópia do contrato de manutenção de um helicóptero, assinada por Senna em 1992 para contratar o serviço de uma empresa de Angra dos Reis, onde tinha uma casa e costumava pilotar seu jet ski.

Na casa do fã há uma decoração especial sobre Senna, porém o acervo não cabe em um só local e está também no escritório e em depósitos. “Eu tento passar os valores e a história do Ayrton para novas gerações. A imagem de alguém dedicado, vitorioso e que se superou é muito forte nele e precisa ser valorizada”.

Uma pesquisa recente do Ibope Repucom comprovou o quanto Senna continua conhecido. O instituto de pesquisas consultou qual o nível de conhecimento e interesse de 94 milhões de internautas sobre personalidades brasileiras. O tricampeão teve a imagem reconhecida por 96% dos entrevistados

O piloto de Fórmula Indy Matheus Leist, de 20 anos, só teve contato com Senna por vídeos, documentários e reportagens. Porém, decidiu deixar na pele uma marca do ídolo. Depois de conquistar em 2016 o título da Fórmula 3 Inglesa na pista de Donington Park, ele encomendou um desenho no braço direito do carro usado pelo tricampeão na vitória histórica no mesmo autódromo, em 1993.

“Decidi fazer algo para simbolizar o Senna, não só pelos resultados dele, mas também pela personalidade e pela mensagem de determinação que ele nos deixou”, disse o piloto. Mesmo sem gostar de automobilismo, a assistente de exportação Tatiane Gemignani tomou a mesma decisão e tatuou o braço. Ela só tinha três anos na época do acidente em Ímola e virou fã há pouco tempo, ao acompanhar um documentário sobre o tricampeão.

Tatiane disse ter se inspirado na história de Ayrton Senna para superar problemas pessoais. “Eu estava passando por problemas pessoas e a história dele me tocou, principalmente a mensagem de persistir, batalhar e lutar. Quis ter isso na minha pele também”.

Depoimento:

É muito impressionante, seja no Brasil ou seja no mundo, o quanto as pessoas se identificam com a gente, que é da família do Ayrton. As pessoas têm uma imensa atitude de carinho, de respeito. É uma conexão afetiva incrível, que não muda com o tempo. Depois de 25 anos, é como se hoje fosse logo depois da morte. As pessoas se emocionam muito, contam histórias, contam onde estavam e o que faziam quando aconteceu. Até hoje não encontrei uma pessoa que não se lembra o que estava fazendo naquele 1.º de maio, seja a pessoa mais simples ou a mais sofisticada.

Dizem que o Brasil é um país sem memória, não sei se é mentira ou se no caso do Ayrton é uma exceção que abriram para ele. Essa memória continua até mesmo hoje para as pessoas que nasceram bem depois da morte. O Ayrton ainda tem uma ligação grande com as pessoas, independentemente da idade e de terem presenciado ou não as corridas dele.

Os pais contam para os filhos ainda pequeno quem era o Ayrton, o que ele fazia acontecer no Brasil e passam isso para os filhos. É uma maneira de transmitir valores. O Ayrton é uma referência, uma inspiração, e fica como esse modelo para várias gerações.

Nós não estamos falando de um ídolo que está na moda e daqui a pouco vai deixar de ser referência. Ele passou para uma categoria que a gente chama de herói, de mito, que transcende o tempo e o espaço. É essa a categoria que o Ayrton habita, o de outro espaço na mente e na coração das pessoas e do mundo.

No Brasil ele teve impacto profundo porque viveu em uma época em que tudo estava dando muito errado nas áreas econômico, política e social, que era a única coisa que sobrava. Ele despontou nesse momento como alguém que conseguia fazer o Brasil ganhar e levantava a nossa bandeira, mostrando que ele se orgulhava de ser brasileiro, diferentemente da maioria, que tinha vergonha. Ele deu uma lição para todos nós de amor pelo País, de patriotismo, de que quer fazer o Brasil dar certo.

O Ayrton quis que o sucesso dele pudesse também ser uma oportunidade para muitas outras pessoas que precisam também de uma oportunidade para dar certo. Desse desejo nasceu o Instituto Ayrton Senna, que é também parte dessa resposta de uma memória tão presente 25 anos depois. O Instituto é uma ação do Ayrton viva todos os anos para mais de 1,5 milhão de crianças espalhadas pelo Brasil. É um duplo legado. Um é de valores, de patriotismo, de garra, determinação. E o outro é um legado de conexão.

Os 25 anos da morte de Ayrton Senna vão ganhar homenagens nesta quarta-feira em duas pistas especiais para o piloto. Em Interlagos, o festival Senna Day terá atividades para o público como simuladores de corrida, exposições de itens do tricampeão e apresentações musicais. Outro local de celebrações será em Ímola, com uma missa que terá início exatamente no horário do acidente: 14h17 local.

Apesar da lembrança triste pela morte, em Ímola o piloto ganhou três corridas da Fórmula 1 (1988, 1989 e 1991). No autódromo há um museu com uma parte dedicada ao brasileiro, além de uma estátua. Piloto de Fórmula 4, o brasileiro Enzo Fittipaldi, de 17 anos, visitou o autódromo recentemente para se inspirar em um dos ídolos que tem na carreira.

“Para mim foi muito especial a visita, porque ele é um dos meus ídolos. Sempre assisto a videos dele pilotando. Foi emocionante passar ao lado do local do acidente. Tem muitas flores, fotos e mensagens do mundo inteiro deixadas por fãs. É um local de muita energia e você sente paz. Só se ouve os passarinhos cantando, o vento soprando nas árvores. É muito especial mesmo”, contou o neto do também campeão de F-1, Emerson Fittipaldi. “Senna foi muito rápido na chuva, assim como é exemplo na disciplina e dedicação que teve pelo esporte. Ele era incrível”, disse.

Em Ímola, além da missa, haverá uma visita guiada à pista e aos boxes. O autódromo está fora do calendário da Fórmula 1 desde 2006 e nos últimos anos tem recebido principalmente corridas de categorias italianas e provas de atletismo.

A festa em Interlagos começa a partir das 7h da manhã. Ao longo do dia, as atividades terão recreação para as crianças, baterias de kart, shows musicais e a experiência de uma volta onboard em Interlagos narrada pelo próprio Ayrton Senna.

Morte de Senna marcou o pior fim de semana da história da Fórmula 1

O acidente de Ayrton Senna foi o desfecho trágico do pior fim de semana da história da Fórmula 1. O GP da San Marino de 1994 teve as mortes do tricampeão no domingo e do austríaco Roland Ratzenberger no sábado, fora o grave acidente de Rubens Barrichello na sexta-feira e uma outra forte batida na largada da prova de domingo entre dois carros.

A sequência de tragédias chocou a Fórmula 1 e levou a categoria a repensar medidas de segurança. Desde 1982, a competição não passava pelo abalo da morte de um piloto. Depois da série de incidentes em Ímola naquele fatídico 1.º de maio de 1994, as alterações nas estruturas dos carros e nos dispositivos de segurança deram à Fórmula 1 o maior período sem acidentes fatais da história. Somente em outubro de 2014, no GP do Japão, a batida fatal do francês Jules Bianchi pôs fim nessa tranquilidade.

O triste GP de San Marino tem entre os principais antecedentes a mudança no regulamento da categoria para aquele ano. Os carros deixaram de ter vários dispositivos eletrônicos, como a suspensão ativa. A alteração procurou deixar a competição mais equilibrada depois de temporadas de domínio da Williams, porém deixou os veículos mais instáveis e difíceis de serem guiados.

Em testes particulares, por exemplo, o francês Jean Alesi bateu forte com a Ferrari e perdeu algumas provas daquele ano. A temporada teve início com provas em Interlagos, no GP do Brasil, e em Aida, no Japão, para o GP do Pacífico, pistas que não tinham a alta velocidade como característica, como era o caso de Ímola, circuito localizado nos arredores de Bolonha, na Itália.

O contato dos novos carros de 1994 com a pista gerou um grande susto logo nos treinos livres, na sexta-feira. Barrichello capotou com a Jordan, desmaiou e teve ferimentos na cabeça e no braço. Senna ainda foi visitá-lo no hospital do autódromo e durante aqueles dias de corrida, manifestou preocupação com a falta de segurança na categoria.

O temor aumentou no sábado. O novato Ratzenberger havia comprado vaga na pequena Simtek para correr somente as três primeiras provas da temporada e tentava marcar tempo no treino classificatório. O aerofólio do carro se soltou e ele bateu de frente no muro. O piloto morreu.

A atmosfera ficou pesada em Ímola, com rumores sobre o cancelamento da corrida. Mas às 14 horas os carros largaram. Quando a luz verde acendeu, um novo susto. A Benetton de JJ Lehto não saiu do lugar e a Lotus de Pedro Lamy acertou em cheio o carro na traseira. Os dois nada sofreram, mas os destroços chegaram a machucar alguns espectadores que estavam na arquibancada.

A direção de prova decidiu não cancelar a largada, mas deixar que as seis voltas iniciais fossem lideradas pelo Safety Car enquanto os fiscais retiravam os detritos na pista. Logo depois, na sétima volta, a disputa foi retomada e o líder da corrida, Ayrton Senna, bateu na curva Tamburello. Um acidente fatal.

 

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