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Finanças: Quando o mercado cheira a sangue, os tubarões não perdoam

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O custo-benefício

Em 1968, um economista americano chamado Gary Becker publicou um artigo chamado Crime and Punishment: An Economic Approach. Esse texto é interessante, pois traz toda a perspectiva econômica para um temática social: a criminalidade.

A abordagem fantástica desse paper em conjunto com outros trabalhos de sucesso garantiu ao autor um (merecido) Nobel anos depois.

Dentre uma série de proposições importantes em relação a punições e como lidar com o sistema de forma a ser mais eficiente, o texto coloca sob a pauta uma premissa bem importante: o ato de cometer um crime é uma decisão racional e baseada em uma análise de custo-benefício.

Isso quer dizer que, antes de cometer um delito, qualquer cidadão pensa tanto no retorno financeiro obtido quanto no custo efetivo. Se isso é feito de forma consciente ou inconsciente não importa, mas o fato é que é assim.

Aos meus amigos de Exatas que, assim como eu, são adeptos a fórmulas, a ideia basicamente seria esta:

Retorno Financeiro  x (1-p) > punição x p ; em que “p” é a probabilidade de ser pego ao cometer o crime.

Essa é uma versão simplificada para os nossos propósitos atuais. Aos meus amigos de Humanas, por favor, não se assustem, vou explicar melhor em palavras. O que a equação acima reproduz é algo bastante simples: o crime precisa compensar o risco para ser realizado.

Em outras palavras, se o indivíduo acreditar que a chance de ser pego é remota ou que ao ser autuado a punição será leve frente ao retorno obtido, o indivíduo tende a cometer o delito.

O contrário certamente é verdade.

Essa realidade pode se estender desde crimes de pequeno delito – como roubar uma fruta na feira – até os mais complexos esquemas de corrupção.

Mas minha ideia aqui não é falar sobre crime. Por mais interessante que o tema seja, existem acadêmicos muito mais qualificados do que eu para discorrer sobre o assunto.

Quero falar com você sobre os fundos de crédito privado e risco versus retorno. Você pode pensar que ambos não possuem relação alguma, porém podemos utilizar a mesma abordagem de custo-benefício para entender por que as pessoas muitas vezes perdem dinheiro com essa indústria – janeiro foi um grande exemplo disso.

A forma como eu encaro é que, ao analisar essa categoria, as pessoas subestimam o risco e a probabilidade de fracasso desse investimento. Isso faz com que entendam que há muito mais retorno sem qualquer contrapartida de risco.

O porquê disso: acredito que seja a ausência de volatilidade, que faz com que os indivíduos atribuam uma probabilidade quase zero de acontecimentos negativos, o que leva a uma decisão óbvia de investir – afinal, há mais retorno sem qualquer risco.

Portanto, em última instância, as pessoas fazem uma análise de risco versus retorno ruim. Em muitos casos, a punição obtida é maior do que o retorno financeiro realizado (ainda que as pessoas entendam o contrário).

Isso acontece principalmente nos fundos de resgate mais curto, nos quais acredito que está o maior problema para o investidor. Focaremos somente neles hoje.

Enfim, quer saber a verdade? Precificar mal esse risco faz você tomar uma decisão que custa caro.

Precificar mal o risco custa caro

A dúvida que eu sempre tive nessa indústria é: por que as pessoas subestimam o risco e a probabilidade de perda?

Bom, a resposta que tenho até o momento é a seguinte: em diversos fundos do mercado, a volatilidade das cotas é utilizada como uma forma de medição de risco. Por exemplo, na alta volatilidade da bolsa, os eventuais prejuízos potenciais ficam muito claros.

Em fundos de crédito, em geral, isso é diferente. A ausência de volatilidade instiga as pessoas a constatarem a ausência de risco, ainda que isso seja um grande engano.

Portanto, a resposta para a subestimação da volatilidade está no fato de as pessoas não entenderem o risco que correm. Os riscos são ocultos e isso deixa a situação ainda mais delicada de ser compreendida.

No entanto, você corre diversos riscos em qualquer tipo de fundo. Riscos relacionados a trocas de time, do processo de investimento, de capacity da estratégia, mercado, entre outros.

Na categoria de fundos de crédito, há um risco adicional: o ciclo de crédito.

Explico melhor. Toda vez que temos um aumento de Selic, existe um detrimento de apostas em ativos de risco (bolsa, multimercados, private equity, ativos internacionais etc.) em direção à renda fixa e vice-versa.

Gráfico mostra o apetite por fundos de ações e fundos de renda fixa quando a Selic aumenta
Fonte: Anbima e Bloomberg; Elaboração: Nord Research

O efeito disso é uma avalanche de recursos nos veículos de crédito e renda fixa, principalmente aqueles com liquidez mais curta.

Essa é a primeira fase do nosso ciclo.

O fluxo de entrada de dinheiro leva os gestores às compras, uma vez que necessitam manter o limite regulatório de pelo menos 50% de alocação do fundo em crédito privado. A tendência natural desse movimento é uma queda dos spreads de crédito e os ganhos embutidos na cota via marcação a mercado.

A performance maior e sem aparentes contrapartidas em riscos adicionais leva a uma conclusão óbvia: mais dinheiro para essa indústria.

O ciclo, então, se retroalimenta.

Onde está o problema?

Isso funciona enquanto o movimento de captação continua forte e segue entrando dinheiro na indústria, portanto não tem atrito.

No entanto, o atrito veio e o nome dele é Lojas Americanas (AMER3).

Postado originalmente por: Nord Research