A imagem de Donald Trump trajando vestes papais, criada por inteligência artificial, pode parecer, à primeira vista, apenas mais uma peça de humor digital. No entanto, seu impacto vai muito além da internet.
A poucos dias do conclave que escolherá o novo papa, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump publicou na sexta-feira (2) uma foto — aparentemente gerada por inteligência artificial — em que aparece vestido como o pontífice.
Politicamente, a montagem reforça a imagem de Trump como um líder quase “messianizado” para parte de sua base. Muitos apoiadores enxergam no ex-presidente uma figura de autoridade moral e quase religiosa, capaz de salvar os “valores tradicionais” americanos. Ao vesti-lo como Papa — a mais alta representação de liderança espiritual católica —, a montagem inconscientemente reforça essa ideia de Trump como um “salvador” para alguns setores conservadores.
A foto colorida, divulgada por Trump na rede Truth Social e repostada pelo perfil oficial da Casa Branca no Instagram, mostra-o sentado em uma poltrona, vestido com uma batina papal branca, coroado com a mitra e usando a imponente cruz de ouro. Sua mão esquerda está apoiada na coxa, e seu dedo indicador direito, apontando em direção ao céu.
A imagem não é acompanhada por nenhuma legenda. Nos comentários, seguidores reprovaram o post.
“Inapropriado, insensível e desrespeitoso”, afirmou um usuário do Instagram.
Por outro lado, a repercussão também escancara os riscos dessa associação forçada entre religião e política. A fé católica, para seus fiéis, não é material de propaganda ou sátira política. Usar símbolos sagrados para promover (ou satirizar) um político não apenas ofende o sentimento religioso, como também pode minar a credibilidade das instituições religiosas. Muitos católicos, inclusive conservadores que simpatizam com Trump, manifestaram repúdio à banalização da fé.
Religiosamente, o episódio evidencia a crescente preocupação entre líderes católicos com o uso indevido de imagens e símbolos sagrados no debate público, principalmente em tempos de campanhas eleitorais acirradas. A instrumentalização da fé para fins políticos não é apenas ofensiva: ela desgasta o valor espiritual das crenças e gera divisões dentro das próprias comunidades religiosas.
Americanos apontaram o absurdo de o perfil oficial do governo repostar a “montagem”.
“Esta é uma conta oficial de mídia social administrada pelo governo. Como representação dos Estados Unidos, ela não deveria zombar de nenhuma religião — muito menos daquela que eles afirmam ter trazido de volta à Casa Branca. Isso é bastante irônico, considerando que o governo Trump não demonstrou nenhum valor ou ação cristã nos últimos 100 dias. Jesus não está na Casa Branca. Judas Iscariotes está. Que vergonha inacreditável”, afirmou uma seguidora.
Em resumo, o episódio Trump-Papa revela:
- O culto quase religioso a figuras políticas nos EUA;
- O desgaste da separação entre símbolos de fé e marketing político;
- O risco crescente de banalização da religião em tempos de hiperpolarização.
Em uma época em que fé e política se misturam cada vez mais perigosamente, episódios como esse mostram como uma simples “brincadeira digital” pode provocar uma verdadeira crise de valores.