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As instituições democráticas somos nós

As Instituições Democráticas Somos Nós

Por João Cenzi

O entendimento do brasileiro sobre “instituições democráticas”, de modo geral, restringe-se apenas às organizações do setor público. No entanto, elas na verdade abarcam todas as regras do jogo, formais ou informais, compreendendo também aquelas sobre as liberdades de expressão e de opinião, de imprensa, do mercado e de manifestações.

As opiniões sobre a força e o correto funcionamento de nossas instituições democráticas hoje são bastante divergentes. Enquanto uns pregam que, apesar de todos os descalabros políticos e de corrupção, elas têm sido fortes o suficiente para mandar para o xadrez alguns czares empresariais e alguns políticos outrora poderosos, outros afirmam categoricamente que estamos também em uma crise institucional.

Do lado do setor público, acho que o mais correto seria afirmar que hoje temos instituições vaga-lume. Ora funcionam, ora nos decepcionam. Quando vemos um ex-presidente, o mais popular que o país já teve, condenado e preso por crimes de corrupção e lavagem de dinheiro, ou o primeiro presidente formalmente acusado pela PGR de corrupção em pleno exercício do mandato, estufamos o peito louvando nossas instituições. Aí, lembramo-nos de que há pouco tempo o principal tribunal eleitoral do país, que somente existe para zelar pela licitude das eleições e do exercício dos mandatos, fechou os olhos para todas as gritantes evidências e provas constantes nos próprios autos do processo e absolveu a chapa Dilma-Temer, que até os aborígenes australianos sabem que participaram do maior estelionato eleitoral já deslindado no mundo.

Apesar de o Supremo Tribunal Federal ter decidido em três ou quatro oportunidades, por maioria de seu colegiado, que condenados em segunda instância podem ser recolhidos ao xadrez, alguns ministros chegam a ser alcunhados de lactopurga, por tanto soltarem monocraticamente corruptos enjaulados preventivamente, e até mesmo já condenados em segunda instância, fazendo da decisão do colegiado a que eles mesmos pertencem uma verdadeira letra-morta.

Do lado privado a dubiedade de atuação também se mostra presente. Nossa imprensa é teoricamente absolutamente livre, nada pode legalmente tolher-lhe o funcionamento e as opiniões. Porém, o que vemos na prática é uma grande imprensa extremamente dependente das benesses financeiras governamentais, sempre tendendo a amenizar as críticas aos poderosos de plantão, enquanto outros veículos menores somente subsistem financiados por esta ou aquela tendência política. Pouquíssimos veículos que se portam de maneira independente se dão bem na luta pela subsistência.

O alto empresariado, detentor de uma fabulosa força de pressão política, dá de ombros para a sociedade e, desde que seus lucros sejam garantidos, alinha-se a quem mais o beneficie no curto prazo, esquecendo que um mercado saudável lhe poderia render melhores frutos, porém com mais esforço.

Felizmente, a única parte dessa miríade de instituições que funcionou a contento foi o povo. Sempre tido como majoritariamente analfabeto político e funcional, que só deseja a presença de um inchado Estado garantidor, aquele que deve tudo controlar e tem a obrigação de amparar os mais desvalidos, mostrou um surpreendente amadurecimento, despachou para casa muitas raposas políticas sonegando-lhes o voto e elegeu para o Planalto um candidato que sempre se mostrou disposto a combater a corrupção e enxugar o Estado.

E então? Nossas instituições democráticas estão funcionando?

Apesar de todo o sarcástico pessimismo até aqui explicitado, ainda penso que, sim, está funcionando. Fomos salvos por nós mesmos, os eleitores, portanto só podemos afirmar que, apesar de ainda termos idiossincrasias jurídicas e políticas, estamos no caminho certo para, com o tempo, corrigi-las.

Se, na política houve uma salutar e inesperada renovação, que aponta para caminhos opostos aos que até agora vínhamos trilhando, na Justiça temos a satisfação de ter visto despontar juízes como Moro, Bretas, Wallisley, Gabriela Hardt e Carolina Lebbos, se não me engano todos da faixa dos 40 anos, os desembargadores da Quarta Região, talvez na casa dos 50, ou seja, uma nova geração que se desponta e mostra que, apesar da contaminação dos mais antigos, aflora uma força moralizante.

Não naquele patamar que nosso ufanismo nacionalista gostaria de bradar ao mundo, mas estamos aprendendo rapidamente. Para um país com pouco mais de cinco séculos de vício, os acontecimentos desses anos de uma eleição a outra foram absolutamente auspiciosos. Se, por um lado, mostrou as vísceras de um Estado podre, por outro serviu para retirar da letárgica conivência grande parte da população, e estamos nos conscientizando de que as Instituições Democráticas, em última instância, somos nós mesmos.

João Batista Cenzi
João Batista Cenzi é engenheiro mecânico, administrador de empresas e, atualmente, diretor da Instituto Pesquisas de Opinião Censuk. É comentarista constantemente convidado nas programações da TV Candidés e da Minas FM.