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Finanças: Um cheque em branco para VVAR?

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Acomode-se na cadeira. Este será um artigo longo. Desculpe-me, mas acredito que a situação justifique.

Uma história antiga

A depender de há quanto tempo você acompanha a Nord, é bem provável que já tenha me visto falar de Via Varejo (VVAR3) diversas vezes.

Não é para menos: as Ações entraram para a carteira do Nord Small Caps há quase 1 ano e meio, em janeiro de 2019. De lá para cá, manifestei-me publicamente sobre a tese em diversas ocasiões — e, na maioria delas, com um viés bastante positivo com relação à atratividade da tese de investimento.

E, de fato, muita coisa aconteceu desde lá: os Klein reassumiram o protagonismo da Companhia; a nova gestão mudou o rumo; inconsistências contábeis foram descobertas e superadas… e todos esses movimentos foram amplamente escrutinados por mim e pelo restante da minha equipe.

Toda história chega a um fim

O que talvez você não saiba — pois, em respeito aos assinantes, não dei publicidade a isto até este momento —, é que recomendei VENDA de VVAR3 na última terça-feira, dia 02.

Com isso, encerramos a recomendação mais emblemática do Nord Small Caps até hoje com ganho de +163,0 por cento.

Em relatório extraordinário, expliquei a decisão: por mais que aplaudamos a evolução operacional recente da Companhia, entendíamos que, nos níveis de preço atuais, o risco-retorno já não compensava. Víamos (e continuamos vendo) o mercado tão empolgado com a tese quanto antes da eclosão da COVID-19 — que, inevitavelmente, trará impactos expressivos aos resultados do 2T20 e, provavelmente, aos trimestres subsequentes.

Tudo uma questão de preço.

E acrescentamos:

Veio a galope…

Na noite seguinte, da quarta-feira (03), a Empresa anunciou a operação. Se quisesse, conscientemente, acertar o timing, não teria conseguido.

A Companhia pretende emitir entre 220 e 297 milhões de novas Ações, com captação estimada entre 3 e 4 bilhões de reais. O efetivo montante dependerá do preço que for estipulado na operação, que ocorrerá na modalidade esforços restritos — ou seja, só poderão participar atuais acionistas e um número predefinido (e limitado, em comparação a uma oferta tradicional) de investidores institucionais.

A opção por esforços restritos denota que a Companhia prefere uma emissão rápida e menos burocratizada. O porquê da pressa não está claro para mim: só o tempo dirá.

Tendo em vista que a primeira data de corte para participação de acionistas era justamente 02/06 — mesma data em que recomendei vender as Ações —, entendi que era meu papel opinar sobre a operação junto aos assinantes do Nord Small Caps. O fiz noite passada.

Mas julguei, também, que convinha compartilhar publicamente minhas impressões.

Os motivos

A Companhia alega que investirá os recursos da Oferta em i) tecnologia e logística, ii) otimização da estrutura de capital e reforço de capital de giro.

Entendíamos (e continuamos entendendo) que a trajetória operacional recente da Via Varejo justificaria, mediante a apresentação continuada de bons resultados pela nova gestão (o que de fato ocorreu até o 1T20), vir a mercado reivindicar novos recursos para acelerar seu processo de transformação digital. Tudo isto era (e é) muito coerente com os movimentos da Empresa ao longo do último ano.

Com relação especificamente à otimização da estrutura de capital e ao reforço do capital de giro, acredito que tenha mais: pontuamos que constatamos, no 1T20, um movimento importante de formação de caixa mediante a antecipação de recebíveis como medida preventiva à deterioração de cenário que se avizinhava no trimestre seguinte.

É fato que o expediente era recorrentemente utilizado pela Empresa, mas o percebemos com maior intensidade naquele momento.

Minhas preocupações

Tem-se então que, em se concretizando um cenário difícil no 2T20 — nosso cenário-base é substancialmente pior do que o que vem sendo sugerido pelos executivos da Companhia em suas recentes declarações públicas —, entendemos que é altamente provável que Via Varejo esteja queimando caixa significativo neste trimestre.

Com menores possibilidades de  recurso a novas antecipações de recebíveis (porquanto as ampliou substancialmente no trimestre passado), acreditamos que a Companhia lance mão de parte da oferta para melhorar seu nível de caixa no curtíssimo prazo.

Trata-se, enfatizo, de uma hipótese: à medida que a Companhia optou por dar prosseguimento à oferta neste momento, não dispomos de dados econômico-financeiros posteriores ao 1T20, mas tão somente declarações esparsas do management em eventos recentes — que, no nosso entender, são insuficientes para uma avaliação adequada da operação.

Ou seja, estamos às escuras.

Aliás, lamento que as circunstâncias nos levem a ter que opinar com relação a uma emissão dessa magnitude (ressalto que estamos falando de algo entre 3 e 4 bilhões…) dessa maneira.

Preferência versus Prioridade

A emissão ocorrerá com exclusão do direito de preferência aos atuais acionistas, mas a eles será dada prioridade na alocação. O efeito prático da iniciativa é que eventuais desinteressados na oferta não poderão negociar direitos de subscrição proporcionais à sua atual participação.

No final das contas, as opções são: i) participar na proporção de 0,169267 da posição detida em 02/06 (por exemplo: quem tinha 1.000 ações pode subscrever 169 novas VVAR3); ou ii) não fazer nada. Caso o lote adicional seja colocado, a proporção em (i) aumenta para 0,228511 (228 novas Ações para cada 1.000 títulos detidos).

O valuation

Com as informações das quais dispomos, estimamos que, na melhor das hipóteses, VVAR nos patamares atuais esteja negociando entre 13 e 15 vezes EBITDA em 2021 — sim, já deixamos 2020 de lado, por razões óbvias. Isto representa prêmio em relação a operações de varejo muito mais consistentes, como Lojas Renner e Lojas Americanas — que, pelo consenso de mercado, negociam ambas na casa das 13 vezes.

Quando dizemos na melhor das hipóteses, fazemos referência i) à atual situação de caixa da Companhia, que desconhecemos e, por outro lado, ii) à magnitude das potenciais evoluções operacionais, traduzidas em margens, que nos parecem passíveis de ocorrer nos próximos 18 meses.

Desnecessário dizer que o risco de execução de VVAR é muito maior do que Renner ou Americanas. Portanto, um desconto substancial no valuation deveria se apresentar. Não é o caso.

Conclusão

Há exatamente uma semana, gravei um vídeo para nosso canal no YouTube expressando exatamente o que pensava da possibilidade de Via Varejo realizar uma oferta nesse momento e nessas circunstâncias.

Infelizmente se concretizou. Nem tudo é como a gente quer. Mas preciso me posicionar.

Tendo em vista que:

  1. Considero o momento da oferta inoportuno: a Companhia atravessa um trimestre dificílimo e temos quase nenhuma visibilidade sobre sua real situação financeira no momento;
  2. O procedimento de oferta pública por esforços restritos se traduz em ainda mais opacidade em relação à situação da empresa;
  3. Em assumindo que a oferta se dê em preços similares aos de mercado, consideramos o múltiplo injustificadamente elevado frente aos pares e ao risco de execução da tese de investimento.

Recomendo não participar da oferta.

Faço-o com tristeza.

Talvez, se fossem outras as circunstâncias e me fosse possibilitado enxergar o real momento atual, a opinião fosse outra. Via Varejo é uma bonita história de superação.

Mas sem números, em meio ao coronavírus, com muitas lojas fechadas… desculpem-me, mas não dá.

Cronograma

A quem ainda assim se interessar, informo:

O período de subscrição prioritária (em outras palavras, o período de reserva destinado aos atuais acionistas) teve início neste dia 04/06 e vai até o próximo dia 10/06. Para participar da oferta, entre em contato com sua corretora. O preço por ação será fixado no próximo dia 15/6; as novas Ações passarão a ser negociadas a partir do dia 17/6 e a liquidação financeira da oferta ocorrerá no dia 18/6.

Postado originalmente por: Nord Research