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Finanças: A virtude da Política não é mudar o mundo

O desafio da eterna busca do justo-meio

Aristóteles foi o primeiro grande sistematizador do tema da “política”. Partindo da observação do mundo físico, concluiu: o homem é um animal político por natureza.

A política, para o filósofo grego, seria uma ordem imposta aos homens. Dessa forma, viver em uma sociedade não se trata de uma escolha, mas o único destino possível: o homem, como ser social, não se basta a si mesmo.

A felicidade do indivíduo depende da felicidade da pólis por dois motivos: primeiro, porque só podemos ser felizes por meio da cidadania; segundo, porque é preciso buscar a virtude para atingir a felicidade.

A virtude, no sentido aristotélico, é a busca pela moderação e comedimento. Não se trata de ser imprudente ou covarde: a virtude está no homem corajoso. Não se trata de ser mesquinho ou esbanjador: a verdadeira virtude é a generosidade. Não se trata de ser vaidoso ou modesto: ser virtuoso é ter respeito próprio.

Se vivesse em 2019, Aristóteles provavelmente seria chamado de isentão. Mesmo assim, eu ainda considero a busca pelo ponto intermediário a forma mais virtuosa de produzir análises políticas.

Na semana passada eu não consegui, pela primeira vez, entregar uma newsletter, exatamente por não enxergar o justo-meio para escrever sobre a notícia mais importante da semana: Bolsonaro não seguiu a lista-tríplice para a indicação do novo Procurador Geral da República.

Liguei para o Ricardo — que, aliás, estava almoçando um com leitor muito querido — e disse: essa semana não vai rolar.

O fato é que escrevi, escrevi, escrevi e não consegui dizer nada. Sexta passada parecia que só existiam duas alternativas: ou dizer a vocês que a democracia estava em risco, ou reafirmar a autoridade do Presidente para escolher alguém fora da lista a partir de um argumento legalista.

Nenhuma delas combina comigo: nem uma visão catastrófica, nem o raciocínio simplista de se limitar ao argumento legal para determinar o que está certo ou errado.

A semana passou e meu cérebro não parou de pensar: “o Ministério Público está em ameaça?” ou o que está ameaçado é o “corporativismo dos Procuradores?”.

O justo-meio foi uma meta para estabelecer que:

  • A independência institucional do MP é um princípio básico;
  • É negativo que procuradores sejam perseguidos ou cooptados pela política;
  • Os rituais internos — como a lista tríplice — não estão isentos de interesses corporativistas dos Procuradores do MPF.
  • É correto que os demais poderes, a partir de rituais legítimos estabelecidos anteriormente, escolham o novo Procurador;
  • É incorreto que esses poderes sejam constrangidos, mesmo agindo dentro da lei, exatamente por não corresponderem às preferências da corporação de Procuradores;
  • O Ministério Público Federal, porém, não existe para ser uma extensão da base aliada do Executivo. Dessa forma, é equivocado comparar o cargo de Procurador Geral da República à “Dama” do xadrez do Executivo, no qual Bolsonaro se auto-intitulou “Rei”.

Flávio Bolsonaro fez questão de colocar a cereja no bolo de gafes: “não queremos no MP pessoas que pensam diferente de nós”.

Qual será o justo-meio desse impasse? Cabe principalmente ao Senado buscá-lo.

Na corda bamba política, o equilíbrio é uma excelente estratégia. Contudo, Marcos Cintra (que, segundo notícias, colecionava inimigos) pendeu para um lado e caiu.

Uma análise justa e equilibrada seria não fazer de Cintra um bode expiatório — isto é, aquele que é sacrificado para purificar os pecados alheios. Porém, a demissão foi comemorada no Governo, no Congresso e na própria Receita Federal.

As previsões apontam para uma negociação menos turbulenta para a Reforma Tributária após a demissão. E a criação de um tributo análogo à CPMF está, hoje, fora de cogitação.

É preciso, entretanto, ponderar que o projeto de criação de um tributo para as transações financeiras (defendido por Cintra) estava diretamente vinculado com a substituição da contribuição previdenciária — um tributo que encarece os custos trabalhistas e promove o desemprego no país.

O novo (e já falecido) Imposto sobre Transações Financeiras era, nas palavras de Paulo Guedes, um imposto feio e chato, mas que arrecada(ria) bem. Temos aí, agora, outro impasse: o que seria melhor, ter uma folha salarial mais leve e os produtos mais caros?

Nunca saberemos.

A única certeza que temos é que política e economia estão em constante relação. O que podemos esperar, portanto, é que uma Reforma Tributária que tenha como objetivo a simplificação interferirá positivamente na produtividade das empresas e na captação de investimentos. Um cenário positivo, portanto, para o mercado.

Mas se fosse uma questão de escolha, muitos de nós optariam por nunca mais sofrer a interferência do Estado em nossas vidas ou negócios. A política me deixa infeliz, porém Aristóteles está correto em afirmar que não conseguimos nos livrar dela.

É por esse motivo que, pessoalmente, acredito que a verdadeira virtude da Política não é mudar o mundo, mas sim evitar que o mundo piore.

Portanto, independente do projeto de Reforma, esse também nunca vai atingir o horizonte ideal. Aceito com resignação que os bons projetos são aqueles que passam pelo ritual democrático sem dificultar mais ainda nossas vidas.

Marize Schons

Em observância à ICVM 598, declaro que as recomendações constantes no presente relatório de análise refletem única e exclusivamente minhas opiniões pessoais e foram elaboradas de forma independente e autônoma.

Postado originalmente por: Nord Research