fbpx
Pular para o conteúdo

Meu resgate

Image
Foto: Pixabay

Já me queixei várias vezes para a minha psicóloga que eu costumo esquecer as coisas simples do dia a dia, principalmente as que me machucam. Então ela me disse que isso era uma defesa inconsciente minha, pois o esquecer me pouparia de muito sofrimento. Prazer, meu nome é Marta quero dividir com vocês um pouco da minha história.

Eu ainda era apenas uma criança, não me recordo exatamente a idade que fui abusada pela primeira vez. Me lembro vagamente de ter ido com a minha mãe a casa de alguns conhecidos, pois ela tinha o costume de nos levar sempre pra benzer ou para rezar. Naquele dia estava presente um homem o qual não me recordo bem, e esse homem disfarçadamente passou a mão nas minhas partes intimas introduzindo o dedo, assim tirando parte da minha inocência.

Por volta dos meus 18 anos conheci meu primeiro e único namorado, que veio a ser meu marido. Desde o início do nosso namoro já existiam vestígios de aquele seria um relacionamento abusivo, mas como eu estava apaixonada e também pela minha falta de experiência, acabei não percebendo tais sinais. Com 5 meses de namoro ele me pediu em casamento. Fiquei em choque e questionei como a gente iria se casar, não tínhamos nada. Mas para ele estava tudo certo.

Namorávamostodos os dias, ele me levava à loucura. Logo na nossa primeira transa, engravidei. Como eu iria contar para os meus pais? Foi um sofrimento enorme sendo eles rígidos e conservadores. Mas o pior ainda estava por vir. Quando eu fui contar para meu namorado já fui direta, disse que se ele não quisesse assumir não tinha problema, mas no fundo esperava dele uma atitude de homem. Ele levou uma semana para tomar sua decisão. Por fim, concordou em nos casarmos. Após a cerimônia do nosso casamento, enquanto aguardávamos para receber os cumprimentos, meu marido abraçou com sua mãe e chorou muito como uma criança totalmente desesperada, me fazendo sentir pena dele.

Eu me lembro que enquanto eu ainda estava na minha primeira gravidez meu marido, que até então era ainda apenas meu namorado, pediu um carro emprestado ao seu irmão e me levou para jantar fora. Isso pra mim foi algo extraordinário, foi um ótimo e caro jantar. Voltando para casa fiquei enjoada, e vomitei. Além de me xingar muito, ele fez questão de contar para seus amigos e familiares o que havia acontecido, me humilhando, dizendo que tinha se soubesse não teria gasto tanto dinheiro comigo, que desperdício de comida, que nem para um jantar eu prestava.

Após um tempo de casados, houve uma noite, não me lembro o motivo, e nem muitos detalhes, quando ele me bateu. Foi a primeira e a última vez que fui agredida fisicamente, pois nessa noite eu chamei a polícia, mas como morávamos ao lado da minha sogra, o irmão mais novo dele que conhecia os policiais interveio no assunto e conversou com eles. Dessa forma a queixa não foi pra frente, não teve B.O., mas já serviu para que ele nunca mais encostasse as mãos em mim. Porém as agressões psicológicas seguiram ocorrendo frequentemente.

Minha segunda gravidez aconteceu quando meu ginecologista pediu para que eu parasse de tomar o anticoncepcional por um mês para trocar por outro, e o que era para ser motivo de alegria se tornou um novo tormento. As reclamações dele eram constantes, “não quero mais um filho, já temos um, que eu nem queria, você é uma irresponsável”. E assim fui culpada e humilhada novamente. Foi mais um período muito sofrido. Para mim foi muito difícil estar grávida, eu não consegui curtir nenhuma das minhas gestações, eu não tinha aquele prazer de ver a barriga crescer, me sentia culpada e envergonhada. No dia em que o meu segundo filho nasceu eu me lembro que fui para a casa da minha mãe.

Ele tinha saído com os amigos para beber. Eu liguei e falei que estava em trabalho de parto. Ele simplesmente falou que não iria ao hospital pois ele não gostava de hospitais. Então eu fui para a maternidade, e só no dia seguinte após a insistência de sua mãe ele apareceu por lá. Mas graças a Deus apesar de tudo meus dois filhos nasceram bem, muito saudáveis. E essa foi uma pequena parte de um relacionamento que durou 24 anos com alguém que me proporcionou muitos sofrimentos, mas também me deu as duas maiores alegrias da minha vida, meus filhos Antônio e Maria.

Hoje consigo enxergar que vivi 10 anos iludida, incapaz de ver a realidade. Os outros 14 anos eu arrastei até enxergar a verdade. E foi assim que criei coragem de procurar apoio psicológico pois eu já não aguentava mais, e assim consegui forças para pedir a separação e me libertar. O projeto Meu Amar é uma corrente de apoio que oferece acolhimento, assistência jurídica e psicológica para as vítimas de violência doméstica. Busque @meuamarprojeto no instagram para conhecer mais sobre o projeto, suas fundadoras e entrar em contato para que posa obter ajuda. Ou ligue 180 disque denuncia.

Texto: Marisa Gomes – Terapeuta, assistente social.

*Texto de uma historia real, mas os nomes relatados acima são meramente fictícios.